quinta-feira, 15 de novembro de 2012

acesso negado, flor de piche e traquejos de língua

desde pequena eu aprendi que meu lugar no mundo era restrito. limitado,condicionado, previamente determinado. eu experimentei o ódio e a rejeição bem cedo. engoli muitos desaforos, os levei pra casa, criei no armário, outros eu travestia em doçura, disfarçava em candura. e sempre fui uma pessoa prestativa. eu precisavava servir pra alguma coisa. pessoas que servem pra alguma coisa são ... pessoas úteis. pessoas assim tem o carinho de outras pessoas úteis, tem problemas reais, tem sangue mais digno correndo nas veias. pelo menos assim é o que me parecia. eu não tinha idéia do lixo e da merda que eu me meteria, eu não tinha idéia da porcalha que minha vida andou beirando. eu, que havia me tornado um verme, minha vida que passou no caminhão de coleta acenando numa luva fedida, os pontos no queijo, a lista de compras, o mofo na unha, o calçado gasto,  o mesmo cheiro de merda, o silêncio de dentro de casa, a tentativa fajuta de redenção, o maltrapilho gosto, o perfume azedo, o ranço no coágulo do cérebro que repete os mesmos nomes, repete, repete, repete, cão desgovernado, pasta de grãos, e meu peito aberto pra exposição. minha vida que passou acenando (...) cuspiu em mim. desconfiou de mim. me seduziu e cuspiu. assim que essa vadia faz, é a especialidade dela. mas deixe que tua hora chega sua vadia. me cospe e manda de volta pro mundo. pro chão, que virou meu lugar, pro chão que é sempre o ponto de partida e parada.

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