quinta-feira, 13 de agosto de 2009

o trem que vai com meu avô.


quando era pequena. do tamanho dum botão. numa caixinha mágica guardei uma delicatessen. um fragmento de memória. filete de lembrança. meu avô e seu último adeus. era interior de Minas. terra vermelha. férias de escola. ele se trancava no quarto pra ouvir música sertaneja. cuidava da criação no pasto como se fossem seus filhos. na vila do adeus. um lugar que nem volta mais. estrada morta. meu avô ficando pra trás. o trem na estação. movimento e fumaça. vertigem. saudade flutuante. ouvi uma balada triste cantando Romaria. minha mãe chorando. minha mãe não chorava na frente de ninguém. igual a ele quando se trancava no quarto. viu seus filhos casarem. teve um filho morto de acidente. verdade em vida. uma camisa e uma dentadura pra ir à rua. um par de sapatos novo. chinelas e uma bermuda rasgada pra trabalhar no pasto. não sabia rezar pra Deus católico. casado que dormia em quarto separado. e minha avó que perdou a traição, mas não aceitou o homem. o Zé João faz uma falta fatigada. céu que desmaia. foi infarte. um barco de saudade fulminante, daquele velhinho limpo de cabelos brancos.
...